Um em cada dois alvos de medidas protetivas com base na Lei Maria da Penha em São Paulo não é notificado após aproximadamente cinco meses da decisão judicial. Em 63% dos casos, por morosidade da Justiça. Nos demais 37%, porque o requerido (a pessoa que põe em risco a integridade de uma mulher, quase sempre um homem) não é localizado nos endereços informados.
A noticia é de DEMETRIO VECCHIOLI. Os dados são do núcleo central da Promotoria de Justiça de Enfrentamento à Violência Doméstica da Capital, do Ministério Público de São Paulo, e dizem respeito a mulheres protegidas pelo projeto “Guardiã Maria da Penha”, uma parceria do MPSP com a Guarda Civil Metropolitana e com a Secretaria Municipal de Políticas para as Mulheres.
“São várias camadas. A mais drástica é o requerido não ter sido localizado. O atraso é também uma camada preocupante. Todo segundo de atraso para que a pessoa seja intimada é considerado uma situação de risco, porque a vítima deixa de ser protegida. Quanto mais tempo demora, maior é o tempo que ela está numa situação de vulnerabilidade”, afirma a promotora Fabíola Sucasas, da promotoria de Enfrentamento à Violência Doméstica.
Há anos atuando em processos que envolvem medidas protetivas, Fabíola convivia com situações recorrentes de requeridos que não chegam a tomar conhecimento formal das decisões judiciais que os proíbem de se aproximar ou manter contato com uma mulher.
Dai veio a proposta de transformar a pesquisa empírica em estatística. De um recorte de 367 casos analisados, todos do núcleo central, que atende o centro da cidade de São Paulo, em 53% o requerido foi intimado, e em 47% não. Dos que não foram, em 63% dos casos o mandado fora expedido, mas ainda não havia sido cumprido. Nos demais 37%, o mandado fora expedido, sem que o requerido tenha sido localizado.
Na prática, isso se transforma em risco de vida para a mulher. “Muitas vezes a mulher entra no Guardiã, entra em contato com a GCM e fala: ‘o agressor está aqui perto’. A GCM vai até o local, localiza o agressor, mas ele não foi formalizado da medida.
Pelo Guardiã, um programa criado em 2014, o Ministério Público encaminha os casos cujas medidas protetivas tenham sido deferidas pelos juízes à GCM e à SMPM, que iniciam a atenção a essas mulheres.
O MPSP e a prefeitura de São Paulo agora têm conversas avançadas para um termo de cooperação que vai permitir que alvos de medidas protetivas sejam reconhecidos pelo programa Smart Sampa e, a partir daí, sejam notificados administrativamente das medidas em vigor. A partir daí, eles não poderiam mais alegar desconhecimento para continuar perseguindo as vítimas.
Pelo projeto, ao localizar um requerido, a GCM faria a comunicação administrativa da medida protetiva. Isso não substitui a notificação judicial, cumprida por um oficial de Justiça, mas é o suficiente para reconhecer que aquela pessoa tem conhecimento das medidas protetivas — por exemplo, que não pode se aproximar ou manter contato com a vítima. Em caso de desrespeito, ele pode ser preso.
Para Fabíola Sucasas, a medida tem potencial de causar grande impacto na redução do número crescente de casos de violência contra a mulher. Só até o início do mês foram 53 casos de feminicídio na cidade de São Paulo, um recorde.