Um projeto de lei enviado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) ao Congresso Nacional cria uma gratificação de desempenho que pode dobrar o salário dos servidores da Corte — em alguns casos, o vencimento tem possibilidade de chegar a R$ 86 mil. Em tramitação na Câmara dos Deputados, a urgência do projeto foi aprovada na terça-feira (9). A é de Alice Groth, do Metrópoles.
Uma semana antes, em 3 de setembro, a Câmara iniciou discussão sobre a reforma administrativa. A proposta, que promete enxugar processos e gastos do funcionalismo público, é classificada pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), como prioridade para este ano.
Um dos objetivos do relator do grupo de trabalho da reforma administrativa, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), é limitar os casos de pagamento de verbas indenizatórias, que compõem os chamados supersalários, como buscar propor o TCU.
O deputado, porém, foi um dos parlamentares que votou pela urgência do projeto. Pedro Paulo justificou que o requerimento autoriza a possibilidade de ser debatido e apreciado pelo plenário e que, se for pautado, votará contra.
Gratificação pode chegar a 100% do salário
O Projeto de Lei nº 2.829/2025 propõe um novo plano de carreira para os servidores do TCU e cria gratificação de desempenho que pode duplicar o salário dos servidores.
“O valor máximo da GDAE [Gratificação de Desempenho e Alinhamento Estratégico] corresponderá a até 100% do maior vencimento básico do cargo efetivo do servidor avaliado, observado o disposto em ato normativo próprio do Tribunal de Contas da União”, estabelece o projeto enviado pela Corte.
O texto também cria um valor extra para servidores com funções de chefia, chamado de Regime Especial de Dedicação Gerencial (IREDG). O adicional poderá chegar a 25% da remuneração bruta, isento de Imposto de Renda e contribuição previdenciária. Até que as regras sejam detalhadas em regulamento, o percentual será de 10%.
Os ganhos ficarão fora do teto constitucional, que, em tese, limita os salários do funcionalismo a R$ 46.366,19. O “penduricalho”, se aprovado, será o primeiro do tipo no TCU.
A proposta também antecipa reajustes salariais até 2029 e amplia o número de cargos comissionados nos gabinetes dos ministros.
No caso de um auditor fiscal no topo da carreira do TCU, com função comissionada, os ganhos totais poderão chegar a R$ 86.190,68 em 2029 — sem contar as vantagens pessoais que o servidor possa ter. Nesse cenário, o IREDG sozinho representaria um acréscimo de R$ 17.283,13.
Como mostrou o Metrópoles, na coluna de Tácio Lorran, a mudança acrescentará mais de R$ 1,6 bilhão em gastos com pessoal de 2026 a 2029. É o equivalente, na média, a R$ 33,9 milhões por mês.
Para TCU, penduricalho é “moderno e equitativo”
Mesmo burlando o teto constitucional e o Imposto de Renda, o novo benefício é descrito pelo TCU como “moderno e equitativo” na justificativa do projeto.
“A criação da IREDG no âmbito do TCU, portanto, alinha a política de gestão de pessoas da Corte de Contas com práticas modernas e equitativas da Administração Pública Federal, garantindo isonomia institucional e fortalecendo a atratividade das funções de confiança”, diz um trecho da justificativa apresentada pelo tribunal.
Ainda de acordo com o TCU, a criação do penduricalho está “alinhada às melhores práticas da Administração Pública”. Na prática, esse tipo de benefício é criticado por economistas e especialistas.
A Corte também afirmou que o projeto de lei visa “recompor perdas inflacionárias” e valorizar a carreira dos servidores. Segundo o órgão, o novo Plano de Carreira não representará impacto adicional para os cofres públicos, pois os aumentos serão bancados por “economia de recurso de outras rubricas orçamentárias”.
Câmara quer “penduricalho” próprio
Segundo noticiado pelo Metrópoles, na coluna de Andreza Matais, o IREDG poderá, em pouco tempo, alcançar outros órgãos públicos: a mesma gratificação consta na última minuta do novo plano de carreira dos servidores da Câmara dos Deputados. Esse projeto ainda não foi formalizado.
Procurada, a Câmara dos Deputados informou que não comenta propostas que estejam em elaboração.
Se prosperar na Casa, é provável que a mesma gratificação acabe se espalhando pelas assembleias legislativas dos estados e até por câmaras de vereadores em todo o país, avaliam pessoas que acompanham as discussões.