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Política

Áudios: aposentados são enganados por parceiro do BMG em consignado

BMG | Divulgação
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Gravações telefônicas revelam como um correspondente do banco BMG citado na operação da Polícia Federal (PF) contra o esquema bilionário de descontos indevidos em aposentadorias do Instituto Nacional do Seguro Social enganou aposentados com o objetivo de obter a confirmação de seus dados e declarações de aceite para fraudar desde empréstimos consignados até filiações a associações envolvidas na farra do INSS.

A notícia do repórter Luiz Vassalo, do Metrópoles, traz que ex-funcionários da Balcão das Oportunidades, que é correspondente do BMG na venda de produtos financeiros, relataram que atendentes da empresa ligam para aposentados com a falsa promessa de redução de juros, ou mesmo estorno de valores indevidos, para, em seguida, editar a gravação e fazer montagens nas quais os beneficiários do INSS aparecem dando “sim” a filiações a sindicatos e associações ou aval a novos consignados.

O Metrópoles obteve acesso a quatro áudios nos quais funcionários da Balcão das Oportunidades dizem aos aposentados que eles têm a receber um valor de pouco mais de R$ 200 como estorno de juros mal calculados. Nessas conversas, os atendentes demonstram ter dados pessoais e até de contas em outros bancos nos quais as vítimas são correntistas. Após ouvir um áudio enviado pela reportagem, o BMG suspendeu o contrato com a empresa e afirmou que repudia a abordagem feita por seus atendentes.

Como funciona o golpe

- Nas gravações, os aposentados são incentivados pelo atendente da Balcão das Oportunidades a aceitar um valor que teria a receber do banco BMG e confirmar seus dados.

- Segundo fontes que forneceram esses áudios à reportagem, a etapa seguinte é editar a gravação para fazer parecer que as vítimas aceitaram novos empréstimos consignados ou filiações a entidades da farra dos descontos e a clubes de benefícios.

O Metrópoles não teve acesso às versões editadas das gravações, mas identificou ao menos um caso em que uma aposentada aceitou o suposto estorno e acabou sendo cobrada pelo BMG no mesmo valor, como se ela tivesse contraído um empréstimo consignado.

“Um valor a receber”

Trata-se do caso da aposentada Maria do Carmo Gonçalves Lara, de 77 anos. Ela recebeu a ligação de uma atendente da Balcão das Oportunidades que disse ser do BMG. “Tô ligando para a senhora, porque a senhora tem um valor a receber do banco, vou explicar. Há um tempo, a senhora fez um empréstimo consignado com a gente e o banco não depositou tudo o que a senhora tinha direito de receber, porque os juros estavam muito altos e tudo mais”, inicia a atendente.

“Tem uma parcela que o banco fez em desconto em folha todo mês da sua aposentadoria, certo, de uns R$ 50. Esse valor que a senhora tem a receber restante está dentro da parcela que a senhora já paga. É um valor de R$ 287,83 e eu tô ligando hoje para ver se a senhora está ciente disso”, prossegue. Na gravação, a atendente informa saber que Maria do Carmo tem uma outra conta e diz até o número dela. “A senhora tem que passar a conta. Se a senhora não achar que é seguro passar eu já tenho aqui no sistema.”

Na ligação, a atendente pede para Maria do Carmo dizer se gostou de seu atendimento com “sim” ou “não”. Desconfiada, ela responde: “Olha, eu gostei do seu atendimento, mas se você estiver dando trote em mim eu levo você para a delegacia”. A atendente ri e diz que o dinheiro vai cair na conta em duas horas caso ela confirme a conta. “O valor não dá nem R$ 300. A senhora acha que eu iria dar um golpe de R$ 300?”

Durante a ligação, a atendente afirma que o dinheiro já poderia ser depositado no mesmo dia na conta da aposentada e consegue obter algumas confirmações de Maria do Carmo, como seu nome e números de documentos. Ao fim, desconfiada, ela põe um parente, que despacha a atendente da Balcão das Oportunidades e desliga.

Depois dessa gravação, Maria do Carmo, que já havia contraído empréstimos do BMG, passou a receber também descontos referentes a saques de um cartão de crédito consignado do banco. Ela procurou a Justiça e afirmou que jamais contratou esse produto.

Em resposta na Justiça, o BMG afirmou que ela não apenas contratou como fez saques e anexou comprovantes. Em um deles, consta que ela teria feito, em 2021, justamente um saque de R$ 287,83, mesmo valor daquele oferecido à aposentada por telefone e que sequer foi aceito por ela. A aposentada disse que nunca desbloqueou o cartão. O processo acabou extinto porque no Juizado Especial, acionado por ela, não se pode fazer perícia – possível apenas nas varas cíveis comuns da Justiça.

Neto na linha

Além do caso da aposentada, o Metrópoles obteve outros quatro áudios nos quais aposentados são induzidos da mesma forma a fornecer seus dados. Em outras gravações, aposentados pedem para seus netos atenderem ao telefone.

Convencidos os parentes, o aposentado volta ao telefone e confirma seus dados. “Não gera nenhuma despesa a mais para ela, não tô aqui vendendo empréstimo consignado. Eu tô ligando para ela apenas para confirmar a informação e depositar o dinheiro”, diz o atendente ao neto de uma aposentada.

Dinheiro da farra do INSS

A Balcão das Oportunidades aparece como destinatária de, pelo menos, R$ 9 milhões de associações de fachada, como a Ambec e o Cebap, ambas ligadas ao empresário Maurício Camisotti. Por meio de funcionários e até parentes, ele controlou as associações e recebeu delas e de uma outra entidade, a Unsbras, mais de R$ 40 milhões.

Associações de Camisotti têm juntado áudios como prova de filiação em processos judiciais cujo teor tem sido contestado por aposentados. Em pelo menos uma situação, um juiz entendeu haver falsidade na gravação e mandou o caso à Polícia Civil de São Paulo e ao Ministério Público.

Uma das primeiras aposentadas entrevistadas pelo Metrópoles na apuração sobre as fraudes no INSS, Nilcea Maria dos Santos, que foi vítima de três diferentes descontos, viu um áudio dela ser juntado a um processo pela Ambec. Sua defesa pediu um incidente de falsidade sobre a gravação. A Justiça não abriu, mas condenou a Ambec a indenizá-la.

O intermediário

O Metrópoles obteve acesso ao contrato entre a Balcão e o Cebap. O negócio tem como intermediário Herbert Kristensson Menocchi, ex-gerente do BMG que também recebeu quantias milionárias das associações da farra dos descontos.

O termo prevê que o correspondente bancário capte novos associados em meio à venda de crédito consignado. Para cada nova adesão, o correspondente ganha 100% do primeiro mês e 21% dos seguintes.

BMG suspende contrato

Procurado pelo Metrópoles, o BMG afirmou que “repudia, com veemência, a abordagem contida no áudio” enviado pela reportagem e “reforça que a conduta do correspondente bancário não condiz com as práticas determinadas pelo banco”. “Diante do ocorrido, o BMG informa a suspensão imediata da Balcão das Oportunidades como correspondente do banco e da corretora de seguros para averiguação dos fatos”, afirma.

O BMG diz que “jamais firmou qualquer acordo de exclusividade com a Balcão das Oportunidades” e que “reafirma seu compromisso com a integridade dos processos e com a proteção de seus clientes, tendo aprimorado a formalização de todas as suas operações e todos os seus contratos nos últimos anos”.

“O processo atualmente inclui checagens com uso de biometria, prova de vida e geolocalização para assegurar que os clientes estão cientes e concordam com a contratação de produtos e serviços do banco. Por fim, o BMG informa que sua Ouvidoria entrará em contato com a cliente Maria do Carmo Gonçalves Lara”, conclui.

A defesa de Maurício Camisotti alega que as acusações de envolvimento do empresário em fraudes são falsas. Segundo seus advogados, a Benfix, empresa dele, foi contratada para administrar “de maneira profissional e moderna as associações e não mantinha negócios com empresas de telemarketing e nem de correspondentes bancários. Esses serviços eram contratados diretamente pelas associações”.

Em nota, Camisotti alega ter contratado “uma das mais respeitadas auditorias internacionais” para analisar os casos em questão e diz que o resultado da checagem será enviado às autoridades para colaborar com as investigações.

Também citada, a Ambec disse ao Metrópoles que o call center e todas as demais atividades de prospecção e filiação de novos associados foram conduzidas por correspondentes bancários – empresas que seriam prestadoras de serviços, sem vínculo de colaboração com a Ambec.

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