A Polícia Federal (PF) afirma que agências da Caixa e do Santander foram usadas para fazer movimentações milionárias para a organização criminosa que dominou parte do setor de combustíveis do país. Os acusados fizeram 9.560 depósitos em espécie, que somaram R$ 331 milhões, sem que os órgãos de controle e fiscalização do setor tivessem sido informados, de acordo com relatório da PF. Com informações do Diário do Brasil.
Pelas normas antilavagem de dinheiro estabelecidas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), para todas as operações suspeitas ou acima de R$ 30 mil, os bancos são obrigados a informar quem são os clientes, a origem do recurso e se a movimentação é normal ou atípica.
Não consta a identificação depositante em nenhum desses depósitos, contrariando obrigatoriedade prevista nos normativos do Coaf – escreveu o delegado Mateus Marins Corrêa de Sá, do Grupo de Investigações Sensíveis (Gise) da PF no Paraná, no pedido de prisão dos acusados investigados na Operação Tank, encaminhado à 13ª Vara Federal de Curitiba.
O Estadão procurou a Caixa e o Santander. O Santander informou que “mantém sistemas robustos e contínuos de controle e reitera seu compromisso rigoroso com a legalidade, a integridade e a legislação de Prevenção e Combate à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo”. O banco esclarece que, “por força destas mesmas normas, está legalmente impedido de comentar casos específicos”.
A Caixa afirmou que “atua conjuntamente com os órgãos de segurança pública nas investigações e operações que envolvem a instituição”.
Tais informações são consideradas sigilosas e repassadas exclusivamente à Polícia Federal e demais autoridades competentes.
O banco estatal informou ainda dedicar “atenção especial ao monitoramento de movimentações financeiras com indícios de lavagem de dinheiro, com a devida comunicação ao Coaf”.
COMO FUNCIONAVA
Segundo o delegado, os bancos registraram as movimentações em nome de uma instituição de pagamentos, a Tycoon, mas não identificaram os clientes. Assim, deixaram de comunicar quem de fato estava movimentando as quantias. A Tycoon Technology Instituição de Pagamento é uma sociedade anônima fechada, constituída em 2016 com capital social de R$ 2 milhões e sede em Curitiba.
Segundo a Junta Comercial do Estado do Paraná, a Tycoon tem 99% das ações em nome de Rafael Belon, um dos presos em 28 de agosto.
A empresa, segundo o delegado, operava o dinheiro vivo de postos de gasolina por meio de ordens de crédito por teleprocessamento (OCT) e contas-bolsão, nas quais o dono do dinheiro não é identificado.
– Os valores portados por Rafael Belon e depositados na Tycoon tinham como origem o “abastecimento de combustíveis e outros”, fato bastante atípico, dado que a Tycoon é uma instituição de pagamento e não um posto de combustível ou uma holding que tenha postos sob sua propriedade.
Com base no documento da PF, a Justiça Federal decretou a prisão preventiva de 14 acusados, muitos dos quais investigados na Operação Carbono Oculto, deflagrada em 28 de agosto, com base nas investigações do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de São Paulo. Entre eles estão os dois empresários apontados como líderes da organização criminosa: Roberto Augusto Leme da Silva, o Beto Loco, e Mohamad Hussein Mourad, o Primo. Ambos tiveram a prisão decretada e estão foragidos.
O questionamento sobre o uso das agências surgiu durante a análise da atuação de duas instituições de pagamento usadas pelo núcleo do esquema no Paraná. A primeira delas era o BK Bank, que movimentou R$ 46 bilhões em cinco anos, dos quais R$ 17,7 bilhões em operações suspeitas, segundo o Coaf. A segunda era a Tycoon.
– A BK atua como intermediária entre a Tycoon e a Duvale (distribuidora de combustíveis), bem como a outras empresas ligadas a Mohamad Hussein Mourad, o Primo, sendo claramente utilizada como camada adicional de ocultação para remeter recursos aos investigados – escreveu o delegado.
Somente através de uma conta, a Tycoon repassou R$ 8,6 milhões ao BK Bank.
Em nota divulgada no dia da Operação Carbono Oculto, o BK Bank informou que “conduz todas as suas atividades com total transparência, observando rigorosos padrões de compliance”. A reportagem não conseguiu localizar a defesa da Tycoon e a de seu sócios. Tanto Mourad, quanto Beto Loco alegam inocência.